Ana Maria resolveu que já era tempo de aprender sobre as novidades da informática. Até pouco tempo atrás, ela fazia parte dos mais de 100 milhões de brasileiros que nunca sequer haviam ligado um computador. Tinha pavor de eletrônicos. “Eles pareciam muito complicados, não pareciam ter sido feitos para mim” comenta a paulista de 49 anos. Entretanto, por conta de seu estabelecimento comercial e da insistência de alguns familiares, ela motivou-se a superar seus medos e ultrapassar seus bloqueios aprendendo as ferramentas básicas (como, por exemplo, um editor de textos) e conhecendo algumas redes sociais (orkut e o twitter). “Esse foi só o primeiro passo. Apesar de ficar meio perdida ainda, as coisas parecem fazer mais sentido para mim agora” relata a comerciante.
O analfabetismo tecnológico refere-se a uma incapacidade em reconhecer o mundo digital e interagir com a tecnologia moderna, principalmente com relação ao domínio dos conteúdos da informática como planilhas, internet, editor de texto, desenho de páginas web etc. A causa do analfabetismo tecnológico é associada à denominada exclusão digital. Esta última vem sendo denunciada em todo o mundo como a forma mais moderna de violência e modalidade sutil de manutenção e ampliação das desigualdades. Tal exclusão não se dá apenas no interior das classes sociais de um país, mas também entre nações e continentes. Os números são assustadores e os efeitos devastadores, não só no que diz respeito a fossos econômicos, como também, culturais. Apenas iniciativas isoladas tais como o programa de alfabetização digital chamado MOVA digital, criado pela Secretaria Municipal de Educação de São Paulo em 2001, são tomadas. Uma atitude em nível nacional ainda se faz necessária.
Segundo a educadora Emília Ferreiro, com o computador assumindo função principal na informação, é fundamental que a sociedade se preocupe com as pessoas que estão à margem desta evolução, para não gerar uma massa de analfabetos tecnológicos. Nesse sentido, o professor está longe de dominar os conhecimentos que o computador exige, chegando a fazer parte dos muitos analfabetos. Concomitantemente, com o avanço dessas novas linguagens e tecnologias oriundas da explosão da informática e da internet, percebe-se que as crianças e os adolescentes são quem mais rapidamente dominam essas tecnologias. Os professores seriam aqueles que mediariam o conhecimento, no entanto, primeiro precisam fazer uso dessa tecnologia para acompanhá-la. O que não acontece na maior parte dos casos. Certamente, seria injusto culpar os professores pela situação. O problema é mais complexo e não será amplamente explanada aqui.
“A internet proporciona um material rico e dinâmico, e cabe a cada um de nós buscarmos interação”, salienta o filho de Ana Maria que é blogueiro. A maioria das pessoas tem utilizado os blogs como diários pessoais, porém um blog pode ter qualquer tipo de conteúdo e ser utilizado para diversos fins. O filho da comerciante é mantenedor de um blog de divulgação científica. “Uma das grandes vantagens das ferramentas de blog é permitir que os usuários publiquem seu conteúdo sem a necessidade de saber como são construídas páginas na internet, ou seja, sem conhecimento técnico especializado” complementa o blogueiro.
Aqui nesse ponto é importante salientar que existem inúmeros, senão milhares de milhões de endereços eletrônicos que armazenam informações sobre pseudociências, medicina, fármacos ou ensino de ciência, por exemplo. Informações postadas nesses sites geralmente não seguem os ethos do cientista. Segundo Robert King Merton, o ethos do cientista - princípios que o cientista precisa seguir para que seu trabalho seja reconhecido pela sociedade, é composto de quatro normas básicas: (i) o universalismo, segundo o qual os trabalhos científicos devem seguir padrões universais de avaliação; (ii) o comunismo, segundo o qual o conhecimento proporcionado pelo trabalho científico é um patrimônio comum da humanidade, e não propriedade privada de algum indivíduo; (iii) o desinteresse, segundo o qual o único objetivo em curto prazo do trabalho científico é a ampliação do conhecimento humano; e (iv) o ceticismo organizado, segundo o qual o cientista deve ser privado de qualquer forma de preconceito e de conclusões precipitadas sobre seus trabalhos.
Esses quatro princípios institucionais do ethos, que estão sempre inter-relacionados, garantem a realização do que Merton chamou de “boa ciência”: a ciência que é aprovada pela sociedade e que, graças a isso, mantém-se íntegra, independente de qualquer determinismo e livre para continuar progredindo. No caso da internet, quem fiscaliza a informação que é postada em blogs e youtube, por exemplo? A internet, para muitos, é considerada terra de ninguém devido à fragilidade ou mesmo inexistência de leis que regulamentam sua utilização. Um exemplo disto é o desrespeito generalizado aos direitos autorais, mas não termina por ai.
A imagem de empresas ou a reputação de cidadãos civis e governantes podem, portanto, ser ameaçadas por um simples correio eletrônico, bem como pode se mobilizar consciências em prol de causas virtuais absurdamente falaciosas. Recentemente, a mais importante sociedade científica brasileira – a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) – viu-se envolvida em um desses episódios. O seu jornal eletrônico, de grande credibilidade e prestígio, reproduziu uma notícia que dava conta de que em escolas americanas estavam sendo utilizados mapas que indicavam a região amazônica e o pantanal brasileiros como “área de controle internacional”.
A informação havia sido gerada por uma corrente eletrônica apócrifa, que buscava emprestar veracidade ao fato citando um site ultranacionalista, que apresentava um mapa com aquelas características. Em resumo, a informação era falsa, foi desmentida categoricamente por embaixadores do Brasil e dos EUA, mas provocou uma imensa rede de intrigas, respaldada, certamente, pelo endosso de fontes de ciência e tecnologia.
As redações dos jornais brasileiros, por conta desta fraude, receberam centenas de mensagens eletrônicas de leitores internautas ao mesmo tempo preocupados e indignados com uma possível invasão americana. É possível imaginar os prejuízos que este tipo de informação pode gerar em momentos em que uma polêmica está acesa ou os ânimos estão acirrados, como, por exemplo, em situações de conflito, como as que vigoram permanentemente entre árabes e judeus no Oriente Médio.
Em suma, a exclusão digital é equivalente à exclusão cientifica estando comprometido com os princípios da ética. O fato de ter no laboratório da escola manipulado de maneira limitada um microscópio simples, não o coloca entre os biólogos. Calcular a velocidade de um corpo não torna você um físico. O físico tem uma sinergia com a ciência que se propôs estudar, tem uma subjetividade em relação ao assunto, muito útil e contextualizada. Um incluído digitalmente deve primeiro ter sinergia com o tratamento de informações, uma pessoa que é organizada já o tem de algum modo, e em um segundo momento ela deve ter a capacidade de ampliar essa sinergia com o uso de elementos eletrônicos (Que hoje pode ser desde um smartphone até uma tv conectada à internet). Além de ética por partes do usuários de este meio que cada vez mais está consolidado, espera-se que haja uma discussão sobre a regulamentação do meio. Em um futuro onde você poderá ligar seu cérebro diretamente com memórias eletrônicas, dirão que os primeiros eram pseudo-incluídos e os novos incluídos digitais reais. Concluindo, por mais crescente que seja os números da Inclusão digital do Brasil comparado com o resto do mundo, o maior desafio é ensinar utilizar esse novo veículo para muito além das fronteiras do entretenimento, ou seja, ter este novo veículo como uma fonte barata e rápida de pesquisas de informações, mas visando transformá-las em conhecimento crítico para o cidadão analisar o mundo ao seu redor
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